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Paulo Jorge Pereira

Agostinho Costa Sousa lê "Julio Cortázar y Cris", de Cristina Peri Rossi

Agostinho Costa Sousa apresenta uma obra de Cristina Peri Rossi, escritora uruguaia radicada em Barcelona e Prémio Cervantes em 2021, na qual se recorda a sua relação especial com o escritor argentino Julio Cortázar.



Que motivações levaram a uruguaia (que também tem nacionalidade espanhola) Cristina Peri Rossi a escrever "Julio Cortázar y Cris"? A própria autora o explicou, numa entrevista ao jornal El Norte de Castilla: "Não tive qualquer intenção autobiográfica - fi-lo como parte da biografia que um dia alguém vai escrever sobre ele", explicou. Mas mais: "E completamente indignada com os rumores que corriam acerca da sua alegada homosexualidade, pois o mais provável é que tenha sido vítima de SIDA. Não devido a contacto sexuais, mas por causa de uma transfusão de sangue", referiu. E lembrou, sobre a obra publicada em 2014: "Quando escrevi o livro havia mais de 10 anos que morrera e penso que foi a primeira vez que assumi que a Cris dos 15 poemas de amor a Cris do seu livro "Salvo el crepúsculo" era eu. Mas nunca aceitei publicar as suas cartas."

Isto é antecipar muito a história, sobretudo a da relação entre a uruguaia - que, integrando o chamado boom literário da América Latina dos anos 60, ao lado de nomes como Vargas Llosa, García Márquez, Carlos Fuentes ou Juan Rulfo, escreveu quase quatro dezenas de obras, sobretudo novelas, poesia e ensaios - e o argentino. Peri Rossi nasceu em Montevideu, a 12 de novembro de 1941. Com a ditadura, teve de procurar o exílio em 1972, fugindo para Espanha e acabando por radicar-se em Barcelona, cidade onde ainda vive. Aqui escreveu a maior parte da sua obra, trabalhando também enquanto tradutora de autores como Clarice Lispector e ainda como jornalista. Já em Espanha, a colaboração entre as ditaduras uruguaia e espanhola obrigou-a a nova fuga no ano de 1973, então para Paris, onde viria a conhecer e travar uma amizade muito especial com Cortázar. Este já lhe dirigira uma carta a confessar admiração depois de ler "El Libro de mis Primos", publicado em 1969: "El libro me buscó a mí, Cristina: fíjate vos que yo estaba escribiendo entonces una novela que se iba a llamar El libro de Manuel y voy y me topo con el tuyo, y esa noche, cuando me lo puse a leer —porque lo empecé a leer de noche, entre el humo de la pipa y un disco de Ray Charles que sonaba como los dioses— me di cuenta de que mi libro era uno de tus primos [...] me parecía fascinante que vos en Montevideo y yo en París tuviéramos la misma idea, mezclar los géneros, prosa y poesía en una novela", escreveu-lhe o autor de "Rayuela", conforme revela o diário argentino Clarín.

E, já depois de Peri Rossi voltar a Espanha, Cortázar não esconde a ternura que lhe dedica: "Pero, además, Cristina, ayer hubo tu pequeña mano siempre un poco fría, un poco gorrión en la llovizna, que se posó en mi pelo y me acarició brevemente, deliciosamente [...] algo me dice que vos y yo venimos ya de una especie de relación anterior, avatares de otra remota amistad. Déjame ser el unicornio que bebe de la mano de la doncella en los tapices medievales; a su manera él es feliz, está colmado."

A profunda amizade que os uniu foi bem expressa pelos dois até à morte do escritor argentino e no livro de Peri Rossi de que hoje aqui é apresentado um excerto por Agostinho Costa Sousa. A uruguaia escreve, recordando a convivência de ambos, citada ainda pelo Clarín: "No he vuelto a París, como tú no has podido volver a Barcelona. Pero te cuento que nuestro restaurante favorito (el Amaya) sigue en las Ramblas, la Fundación Miró continúa con su olivo central y estoy segura, completamente segura, de que te fascinarían La vie de Adèle (me dirías: 'por qué no escribiste vos el guión?') y La venus de las pieles, de Polanski."

Mais à frente, ainda lembrando um conjunto de paixões partilhadas, relembra, segundo o jornal argentino: "Estuvieras donde estuvieras (porque viajabas muy a menudo: huías de París, a veces, a lugares remotos, no solo a Cuba o a Nicaragua), siempre encontrabas algún libro sobre dinosaurios para enviarme, o una postal del Monstruo del lago Ness, o una maqueta."

Foram sempre muito próximos, íntimos, confidentes. E Cortázar dedicou-lhe poesia, remetendo-lhe "Cinco Poemas para Cris", "Otros Cinco Poemas para Cris" e "Cinco últimos poemas para Cris" em 1977. A escritora sentiu-se baralhada. "Confieso que su lectura, en un principio, me apabulló. Yo, la poeta, me veía ahora tratada como musa, como objeto, y el cambio de papeles trastornaba un poco mi identidad. Pero la identidad no es más que el nombre que damos a nuestros hábitos y costumbres", admitiu.

Contaria na obra "La Insumisa" (2020), onde aborda os primeiros anos da sua vida e o tempo da adolescência, o episódio de violação que sofreu. Em novembro de 2021, numa entrevista ao espanhol Público, citada no seu site, confessa ser "submissa às leis, mas não às convenções sociais, à injustiça, à desigualdade e às diferenças de classe, de cor ou de atividade sexual". Nunca escondeu a sua preferência sexual por mulheres e, na obra poética, dedicou-lhes muitos dos seus versos. Manteve também a coerência no seu posicionamento político à esquerda e na defesa dos direitos humanos.

Para lá do trabalho poético e dos ensaios, a lista das suas novelas inclui "El Libro de mis Primos" (1969), "La Nave de los Locos" (1984), "Solitario de Amor" (1988), "La Última Noche de Dostoievski" (1992), "El Amor es una Droga Dura" (1999), "Todo lo que no te Pude Decir" (2017) e o já referido "La Insumisa" (2020).

É possível saber mais sobre a vida e o trabalho de Cristina Peri Rossi, agraciado ao longo dos anos com quase duas dezenas de prémios, no seu site oficial aqui.


Cálamo


"Para mim, a imaginação é o reino da liberdade e deixo que flua de forma espontânea", admitiu ao jornal espanhol Público, em novembro de 2021, depois de ser distinguida com o Prémio Cervantes. Na mesma entrevista em que reconhece ser "uma franco-atiradora, uma trapezista que realiza os seus saltos em rede por baixo".

Agostinho Costa Sousa reside em Espinho e socorre-se da frase de Antón Tchekhov: "A medicina é a minha mulher legítima, a literatura é ilegítima" para se apresentar. Estreou-se a ler por aqui a 9 de maio com "A Neve Caindo sobre os Cedros", de David Guterson, seguindo-se "As Cidades Invisíveis", de Italo Calvino, a 16 do mesmo mês, mas também leituras de obras de Manuel de Lima e Alexandra Lucas Coelho a 31 de maio. "Histórias para Uma Noite de Calmaria", de Tonino Guerra, foi a sua escolha no dia 4 de junho. No passado dia 25 de julho, a sua escolha recaiu em "Veneno e Sombra e Adeus", de Javier Marías, seguindo-se "Zadig ou o Destino", de Voltaire, a 28. O regresso processou-se a 6 de setembro, com "As Velas Ardem Até ao Fim", de Sándor Márai. Seguiram-se "Histórias de Cronópios e de Famas", de Julio Cortázar, no dia 8; "As Palavras Andantes", de Eduardo Galeano, a 11; "Um Copo de Cólera", de Raduan Nassar, a 14; e "Um Amor", de Sara Mesa, no dia 16. A 19 de setembro, a leitura escolhida foi "Ajudar a Estender Pontes", de Julio Cortázar. A 17 de outubro, a proposta centrou-se na poesia de José Carlos Barros com três poemas do livro "Penélope Escreve a Ulisses". Três dias mais tarde leu três poemas inseridos na obra "A Axila de Egon Schiele", de André Tecedeiro. A 29 de novembro apresentou "Inquérito à Arquitetura Popular Angolana", de José Tolentino de Mendonça. De dia 1 do mês seguinte é a leitura de "Trieste", escrito pela croata Dasa Drndic e, no dia 3, a proposta foi um trecho do livro "Civilizações", escrito por Laurent Binet. No dia 5, Agostinho Costa Sousa dedicou atenção a "Viagens", de Olga Tokarczuk. A 7, a obra "Húmus", de Raul Brandão, foi a proposta apresentada. Dois dias mais tarde, a leitura foi dedicada a um trecho do livro "Duas Solidões - O Romance na América Latina", com Gabriel García Márquez e Mario Vargas Llosa. Seguiu-se "O Filho", de Eduardo Galeano, no dia 20. A 23, Agostinho Costa Sousa trouxe "O Vício dos Livros", de Afonso Cruz. Voltou um mês mais tarde com "Esta Gente/Essa Gente", poema de Ana Hatherly. No dia 26 de janeiro, apresentou "Escrever", de Stephen King. Quatro dias mais tarde foi a vez de Maria Gabriela Llansol com "O Azul Imperfeito". "Poemas e Fragmentos", de Safo, e "O Poema Pouco Original do Medo", de Alexandre O'Neill, foram outras recentes participações. Seguiram-se "Se Isto É Um Homem", de Primo Levi, e "Se Isto É Uma Mulher", de Sarah Helm. No dia 18 de março, a leitura proposta foi de um excerto de "Augustus", de John Williams. A 24, Agostinho Costa Sousa leu "Silêncio na Era do Ruído", de Erling Kagge; a 13 de abril, foi a vez do poema "Guernica", de Rui Caeiro e, no dia 20, apresentou um pouco de "Great Jones Street", de Don DeLillo. No Especial dedicado ao 25 de Abril, a sua escolha foi para "O Sangue a Ranger nas Curvas Apertadas do Coração", escrito por Rui Caeiro, seguindo-se "Ararat", de Louise Glück, no Dia da Mãe e do Trabalhador, a 1 de maio. "Ver: Amor", de David Grossman, foi a proposta de dia 17. No dia 23, a leitura proposta trouxe Elias Canetti com um pouco da obra "O Archote no Ouvido". A 31 de maio surgiu com "A Borboleta", de Tonino Guerra. A 5 de junho trouxe um excerto do livro "Primeiro Amor, Últimos Ritos", de Ian McEwan. A 17, a escolha recaiu sobre "Hamnet", de Maggie O'Farrell. A 10 de julho, o trecho selecionado saiu da obra "Ofuscante - A Asa Esquerda", do romeno Mircea Cartarescu. No dia 19 de julho apresentou "Uma Caneca de Tinta Irlandesa", de Flann O'Brien. A 31 de julho leu um trecho da obra "Por Cuenta Propia - Leer y Escribir", de Rafael Chirbes. No dia 8 de agosto foi a vez de "No Entres Docilmente en Esa Noche Quieta", de Ricardo Menéndez Salmón.



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