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Paulo Jorge Pereira

Armando Liguori Junior lê "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", de Jorge Amado

Portugal despertou em 1977 com Jorge Amado e a telenovela "Gabriela, Cravo e Canela", que os brasileiros viram em 1975, para a sensualidade de Sónia Braga, mas o livro e o autor, Prémio Camões em 1994, já eram maiores do que a própria vida muito antes disso. A atriz seria protagonista nos ecrãs de uma outra obra de Amado, então no cinema, com "Dona Flor e seus Dois Maridos" (1976). Mas hoje recupera-se um excerto da obra "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", trabalho para os mais jovens e prenda de anos para o filho João, apresentado por Armando Liguori Junior.



Quando o final da vida chegou, a 6 de agosto de 2001, Jorge Leal Amado de Faria, nascido na baiana Itabuna a 10 de agosto de 1912, publicara cerca de meia centena de obras com milhões de exemplares vendidos nos diferentes idiomas das oito dezenas de países que apresentaram o seu trabalho. Tivera ainda uma vida preenchida por peripécias políticas e, sendo comunista, por detenções e exílios. E cedo o filho do coronel João Amado de Faria e de Eulália Leal, passando a maior parte dos seus primeiros anos de vida na Ilhéus que seria inspiração para diversos livros, procurou os meios literários, participando com apenas 14 anos na fundação da Academia dos Rebeldes em Salvador. Com os cúmplices dessa aventura foi publicando em diversas revistas e seguiu para o Rio de Janeiro com o objetivo de se licenciar em Direito. É de 1931 a publicação do seu primeiro livro: "O País do Carnaval". Seguiram-se "Cacau" (1933), "Suor" (1934), "Jubiabá" (1935), "Mar Morto" (1936) e "Capitães da Areia" (1937) - de que aqui se lê um excerto e que ganhou, em 2011, adaptação ao grande ecrã - a maravilhosa história de um grupo de crianças abandonadas, das suas estratégias de sobrevivência nas ruas e dos laços que entre elas se estabelecem. E também livro que foi apreendido e queimado em público por ordem da ditadura como sinal da sanha persecutória ao autor e à sua obra. Entretanto, na universidade tomara contacto com a política e as ideias comunistas, acabando por seguir o mundo do jornalismo, apesar de já licenciado em Direito.

A meio dos anos 40 já publicara outros cinco livros, mas também já fora preso no Rio de Janeiro e em Manaus, tendo de submeter-se aos primeiros exílios na Argentina e no Uruguai. Casara-se em 1933 com Matilde Garcia Rosa, de quem teve uma filha, mas divorciaram-se quando Amado voltou ao Brasil. Entretanto, Zélia Gattai era leitora e admiradora de Jorge Amado quando o conheceu em 1945, tendo os dois começado por estar lado a lado graças ao movimento pela amnistia para os presos políticos. Decorreram apenas meses até Zélia e Jorge se tornarem um casal e, em 1946, após o escritor ser eleito para a Câmara Federal como candidato pelo Partido Comunista (PCB), passaram a viver no Rio de Janeiro, aqui nascendo o primeiro filho, João Jorge, em 1947. Mas depressa a situação se modificou, uma vez que o PCB foi ilegalizado pelo governo Dutra e todos os eleitos nas suas listas viram os mandatos sob cassação. Foi assim que a família teve de partir para o exílio, vivendo durante três anos entre Paris (onde foi escrito, em 1948, como prenda de anos para o filho, a obra "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", que hoje é aqui apresentada por Armando Liguori Junior, embora só em 1976 fosse reencontrado e lido por João - fase que Zélia aproveitou para se matricular na Sorbonne e ali tirar os cursos de Civilização, Língua e Fonética Francesa - e Praga, na então Checoslováquia, no começo dos anos 50 e onde nasceria a filha Paloma (assim chamada em homenagem ao amigo Pablo Picasso, cuja filha, nascida em 1949, tem esse nome).

É desta altura a escrita de "Jardim de Inverno", obra em que Zélia conta histórias das dificuldades no exílio, incluindo da viagem à China. Ao mesmo tempo dedicava-se à fotografia, passando a registar inúmeros episódios da vida de Jorge Amado nesse período, culminado com o regresso ao Brasil em 1956, altura em que se afasta do Partido Comunista. Destes anos 50 é também a escrita de um livro que marcou a vida literária de Jorge Amado, justificando a admiração de milhões de leitores: "Gabriela, Cravo e Canela" (1958) - que se tornaria telenovela no Brasil em 1975 (em 2012 teve uma nova versão, então com Juliana Paes no papel que fora de Sónia Braga) e, dois anos mais tarde, revolucionaria hábitos em Portugal, levando milhões de portugueses a seguir essa estreia do género como nenhuma outra das inúmeras telenovelas que vieram depois. No ano seguinte surge "A Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água e, em 1963, Zélia apresentaria a fotobiografia do escritor em "Reportagem Incompleta".

No Brasil, o casal iria ter oportunidade de se instalar em Salvador, na Bahia, naquela que ficou conhecida como Casa do Rio Vermelho e Zélia assumiu um papel ainda mais preponderante no plano cultural. Em 1966, escreve outra obra marcante, "Dona Flor e seus Dois Maridos", que terá adaptações ao cinema em 1976 com Sónia Braga, José Wilker e Mauro Mendonça, e ainda em 2017, então com Juliana Paes, Marcelo Faria e Leonardo Hassum. É já um escritor consagrado, convidado para palestras em todo o mundo, e continua a publicar: "Tenda dos Milagres" (1969), "Teresa Batista Cansada de Guerra" (1972, livro que se tornou uma minissérie da Rede Globo em 1992), "Tieta do Agreste" (1977, obra também adaptada a telenovela), "Farda Fardão Camisola de Dormir" (1979).

É nesta altura que a mulher, aos 63 anos, resolve escrever as memórias da sua vida: a obra intitulou-se "Anarquistas, Graças a Deus" e, duas décadas depois da edição de estreia, as vendas superavam os 200 mil exemplares (em 1984, o livro ganhou também dimensão de minissérie, sendo Walter George Durst o autor). Amado também não descansa e, entre os livros que vai escrevendo até aos anos 90, destacam-se "Tocaia Grande" (1984), "Navegação de Cabotagem" (1992), "A Descoberta da América pelos Turcos" (1994) e "O Milagre dos Pássaros" (1997). Pelo meio, aos inúmeros galardões que colecionara, junta-se em 1994 o Prémio Camões. Zélia Gattai aproveita para publicar outros livros de memórias - "Um Chapéu para Viagem", "Senhora Dona do Baile", "Chão de Meninos", "A Casa do Rio Vermelho" ou "Città di Roma"), mas também romance ("Crónica de uma Namorada") e literatura infantil ("Pipistrelo das Mil Cores", "O Segredo da Rua 18", "Jonas e a Sereia").

Os problemas de saúde começaram a ter aspetos mais sérios para Jorge Amado a partir do começo dos anos 90, quando o coração deu sinais de fadiga. Foi operado em 1996 e a diabetes lançou-lhe diversos avisos. A insuficiência cardíaca passou a ser uma companhia ameaçadora, espécie de espada de Dâmocles sobre a sua cabeça. Aos alertas dos anos 90 seguiu-se o internamento a 20 de junho de 2001, numa situação que o deixou em coma. Ainda assim, apesar de uma infeção pulmonar durante essa fase no hospital, acaba por recuperar e receber alta a 16 de julho. Mas o tempo já estava a correr contra o escritor e a paragem cardiorrespiratória que sofre a 6 de agosto torna-se definitiva.

Após a morte de Jorge Amado, que preenchera a vaga de Machado de Assis na Academia Brasileira de Letras, Zélia foi escolhida em 2002 para ocupar a cadeira que pertencera ao marido. Precisamente desse ano é a obra que escreveu com os filhos sobre lembranças de Jorge Amado, "Um Baiano Romântico e Sensual". Depois disso publicou "Memorial do Amor" e "Vacina de Sapo e Outras Lembranças". Prossegue as suas atividades literárias e homenageia a memória de Amado. Mas também o seu estado de saúde acaba por sofrer abalos. Sábado, dia 17 de maio de 2008. Em Salvador, Zélia Gattai, de 91 anos, fora internada no Hospital da Bahia a 16 de abril e recuperava de uma intervenção cirúrgica aos intestinos. Tivera uma fase de franca melhoria, mas, de repente, o processo inverteu-se e o seu estado de saúde piorou de forma considerável. Era sábado, dia 17 de maio de 2008, 16h30. Foi essa a hora que ficou registada como a da morte.


Companhia das Letrinhas/Ilustrações de Caribé


Amado escreveu o livro como oferta para o filho João, em 1948, mas só em 1976 aquele leu a obra e entregou-a a Carybé para que este a ilustrasse.

Antes da proposta recuperada hoje, com Armando Liguori Junior, a obra de Jorge Amado surgira aqui em estreia a 8 de fevereiro de 2021 com um trecho de "Capitães da Areia".

Armando Liguori Junior, ator e jornalista de formação, publicou, em 2023, "Eu Poderia Estar Matando" e, mais recentemente, as obras "Sempre Haverá uma Gota de Sangue em cada Poema" (uma novela policial) e "Latidos: Poemas de Amor ou quase ou nem" (poesia). Mas tem outros livros publicados: três de poemas ("A Poesia Está em Tudo" – Editora Patuá 2020; "Territórios" – Editora Scortecci 2009; o recente "Ser Leve Leva Tempo", que já aqui apresentou; e um de dramaturgia: "Textos Curtos para Teatro e Cinema (2017) – Giostri Editora). Atualmente mantém um canal no YouTube (Armando Liguori), dedicado a leituras literárias, especialmente de poesia.

Relembro que o meu Amigo esteve em Portugal, dirigindo e atuando pelo Coletivo de Teatro Commune - no Espaço Arenes, em Torres Vedras, e em Montemor-o-Novo, no Cineteatro Curvo Semedo, com a comédia "Ubu Rei", tendo por base a obra de Alfred Jarry. Foi a Companhia João Garcia Miguel que começou por receber, em Torres Vedras, o meu Amigo Armando Liguori Junior e o restante coletivo para a comédia "Ubu Rei", num elenco com Augusto Marin, Esther Góes, Fabricio Garelli, Natalia Albuk, Paulo Dantas e Juliano Dip. No dia 21 de março, às 21h30, estiveram também no Cineteatro Curvo Semedo, em Montemor-o-Novo, para outra sessão da sua comédia.

Nesta visita, além do sucesso alcançado junto do público com a oportuna comédia, houve finalmente a oportunidade de nos encontrarmos sem ser via Internet.

Estreou-se nas leituras aqui para o blog com "Se te Queres Matar Porque Não te Queres Matar?", de Álvaro de Campos, a 15 de julho de 2020, seguindo-se "Continuidades", de Walt Whitman, a 7 de agosto e "Matteo Perdeu o Emprego", de Gonçalo M. Tavares, a 11 de setembro, várias leituras do meu "Murro no Estômago" (a 16 de outubro de 2020 e a 5 de setembro de 2021). Em 2021, a 12 de fevereiro, apresentou "Pelo Retrovisor", de Mário Baggio, seguindo-se "A Gaivota", de Anton Tchekhov, a 27 de março, Dia Mundial do Teatro; "A Máquina de Fazer Espanhóis", de Valter Hugo Mãe, a 5 de maio, Dia Mundial da Língua Portuguesa; e, a 10 de junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, com leituras de "Cheira Bem, Cheira a Lisboa", de César de Oliveira, e um trecho de "Viagem", de Miguel Torga. A 26 de outubro surgiu "O Medo", de Carlos Drummond de Andrade, e Niels Hav com "Em Defesa dos Poetas" foi o passo seguinte, a 28. Antes de hoje, Armando Liguori Junior apresentara "Algo Está em Movimento", de Affonso Romano de Sant'Anna, a 30 de outubro de 2021. A 2 de março de 2022 leu "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", de Jorge Amado, e no dia 6 apresentou "A Máquina", de Adriana Falcão. "As Coisas", de Arnaldo Antunes, foi a proposta de 13 de março.

A 5 de maio, Dia Mundial da Língua Portuguesa, leu "Ser Leve Leva Tempo". A 13, Armando Liguori Junior deixou outro exemplo de talento ao ler "Pássaro Triste", do seu livro "Toda Saída É de Emergência". No dia 19, Cecília Meireles e o poema "Escolha o seu Sonho" foram as propostas. Seguiu-se um excerto de "Macunaíma", de Mário de Andrade, a 27 de maio. De 3 de junho é a proposta de leitura de "Sapatos", de Rubem Fonseca. A 4 de novembro leu "Samadhi", de Leila Guenther. De dia 24 é "Carta a Meus Filhos sobre os Fuzilamentos de Goya", de Jorge de Sena. "O Gato e o Pássaro", de Jacques Prévert", foi a leitura de 29 de novembro.

A 13 de janeiro trouxe um poema de Cristina Peri Rossi. A 5 de maio, no Especial sobre o Dia Mundial da Língua Portuguesa, aqui voltou o seu "Ser Leve Leva Tempo". A 18 de maio voltou "O Medo", de Carlos Drummond de Andrade. No dia 5 de junho apresentou "O Poeta Fernando", inserido no seu novo livro intitulado "Eu Poderia Estar Matando". A 15 de junho regressou "Algo Está em Movimento", de Affonso Romano de Sant'Anna. A 19 de junho leu "O Último Poema do Último Príncipe", de Matilde Campilho. A 28 de agosto voltou "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", de Jorge Amado. De 9 de novembro é a leitura do meu terceiro livro, "Filho da PIDE". "Diluição", de Joana M. Lopes, foi lido a 29 de novembro. Voltou a 5 de dezembro com "Escolha o seu Sonho", de Cecília Meireles. A 28 de dezembro leu "Os Invisíveis", de José Henrique Calazans. "Samadhi", de Leila Guenther, voltou a 19 de janeiro. De 29 de janeiro é o poema "Ama os teus Sonhos", de Alice Vieira. A 9 de fevereiro leu "Coisas Que Não Há Que Há", de Manuel António Pina. De 19 desse mês é uma nova leitura do meu segundo romance e terceiro livro, "Filho da PIDE". A 16 de março regressou "Os Invisíveis", de José Henrique Calazans. A 2 de abril trouxe uma outra leitura de um excerto de "Filho da PIDE", algo que se repetiu a 8 e a 24 e a 4 de maio. A 18 de junho leu "Regresso", de Manuel Alegre. De dia 6 de setembro é a leitura de um trecho da "Ode Marítima", de Álvaro de Campos.

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