Com o conto "O Louco", é possível compreender um pouco dos ambientes e territórios humanos desolados percorridos pelo livro "Histórias de Um Tempo Só", de Ana Zorrinho.
Contos que escorrem solidão, amargura, desespero, desolação, velhice: estes são alguns dos fios condutores da obra "Histórias de um Tempo Só", livro que Ana Zorrinho publicou em 2019. Imagens escritas do Alentejo em que se sente o abandono em cada frase e não há leitor que escape àquelas angústias, não é possível ficar indiferente, nem há pontos de fuga. Mais do que isto: somos compelidos a entrar naquelas histórias profundamente humanas e, quando nos apercebemos, é como se estivéssemos naqueles espaços, vivendo aquelas realidades, submetendo-nos àqueles irremediáveis novelos de ação e conhecimento. Depressa nos sentimos como se cada um de nós fosse personagem, porque aqueles pedaços de ficção ganham vida e vêm buscar-nos. Ficamos tão sós como, de facto, estaremos tantas vezes pela vida fora e até que a morte nos derrote conforme está previsto. Não tendo sido escrito com a noção de que uma pandemia se aproximava e tudo iria alterar-se, lido à luz dos tempos que correm não é difícil encontrar ali metáforas sobre o que é a condição humana destes dias estranhos nas suas múltiplas facetas, nas suas contradições, nas suas evoluções e recuos. Há corações a pulsar e frémitos de emoção que parecem não ter fim. E, mesmo quando se sai do livro, o livro não sai de nós - teima em permanecer e, de vez em quando, sinaliza-nos a sua persistente presença.
Há poesia de Manuel da Fonseca a marcar a vida da autora (conheceu-a e interpretou-a na sua formação teatral), nascida em Santiago do Cacém em 1978. Licenciada em Direito pela Universidade de Lisboa, as Letras começaram por ganhar uma entusiástica escritora de poemas para música antes da chegada aos contos que compõem o livro aqui apresentado. Pelo meio, as diferentes ações desenvolvidas no universo do teatro: como atriz a participar no grupo GATO SA; como diretora do grupo Sociedade Harmonia, tendo a juventude como destinatária direta; adaptando e escrevendo para levar à cena. E, claro, a dedicação às leituras para estudantes e ainda o "Silêncios", poesia sob a forma de curtas-metragens. Nos últimos meses, já sob o efeito subjugador da pandemia, dedicou-se de alma e coração a um outro projeto incomum. Mas desse será dada (e mostrada) notícia em breve aqui no blog.
Editora Caleidoscópio
Além da escrita, são vários os projetos a que Ana Zorrinho se dedica - em breve ficaremos a conhecer um deles mais de perto...
O livro de Ana Zorrinho tem ilustrações de Raquel Ventura, desenhos perfeitos para adensar angústias, silêncios, medos...
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