O experiente jornalista de Desporto da RTP Porto, Manuel Fernandes Silva, escolhe um excerto de uma das obras mais conhecidas de Luis Sepúlveda, escritor chileno vítima de Covid-19 no passado dia 16 de abril. "Mundo do Fim do Mundo" é uma fascinante incursão pelos mares do Sul, pelo universo dos baleeiros e pela denúncia de crimes com conivência governamental chilena.
Um percurso de vida e uma obra do lado dos oprimidos, dos perseguidos, erguendo a voz contra as desigualdades e recorrendo à escrita não só para contar histórias apaixonantes, mas também para que a memória seja um músculo sempre em exercício. E para apontar os culpados, os filhos da puta que, do seu Chile natal à outra ponto do mundo, nunca deixam de usar a força para subjugar, humilhar e assassinar. Luis Sepúlveda tornou-se um dos escritores latino-americanos com mais livros vendidos, porque o seu talento a recriar geografias e personagens com sentimento lhe assegurou a entrada no coração de leitores pelo mundo fora. E porque nunca poupou na linguagem quando se tratava de falar sobre crimes de Estado, patrocínio de golpes militares e ditaduras como de Pinochet por parte dos Estados Unidos. Ou a defender em público valores como a liberdade, a democracia, a solidariedade, o ambiente (foi membro da Greenpeace), porque sempre considerou um dever essa participação cívica. Mas, como homem que correu mundo e tantos mundos diferentes viu, foi também capaz de passar para o papel uma aprendizagem única sobre o ser humano.
A pandemia apunhalou Sepúlveda pelas costas e, ap´so mês e meio de luta pela vida, o chileno perdeu o combate, morrendo aos 70 anos a 16 de abril do ano passado. Nesse mesmo dia foi homenageado aqui no blog. Os seus livros vão permanecer e a sua voz não irá calar-se porque, como disse numa entrevista ao jornalista Miguel Carvalho da revista Visão, em outubro de 2003, "a minha literatura é um ato de resistência". E Luis Sepúlveda nunca deixará de ser um resistente.
Tradução de Pedro Tamen (Edições ASA)
Quando o jornalista Miguel Carvalho, da revista Visão, lhe perguntou se o perdão cabia no seu dicionário chileno, Sepúlveda foi bem claro na resposta: "Não, não cabe. Nisso, sou como o Conde de Monte Cristo: não esqueço, nem perdoo. Com o perdão não se devolvem as vidas que a ditadura levou", indicou.
Licenciado pela Escola Superior de Jornalismo do Porto, há mais de duas dezenas de anos que Manuel Fernandes Silva é rosto e voz do Desporto na RTP Porto, na qual entrou com apenas 22 anos. Jornalista com presença em muitas das maiores competições à escala planetária, editor, coordenador, apresentador de programas, não se esconde no momento de opinar sobre o país e o mundo. Entre 2008 e 2011 foi também docente na Escola de Jornalismo do Porto. Se o Desporto é o ponto de partida e uma paixão, não é mero ponto de chegada nem única paixão. Porque gosta de liberdade, diversidade e solidariedade, não é de unanimidade que se faz o seu dia a dia. Tanto melhor para ele. E para todos nós que o admiramos na sua complexa simplicidade.
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