O clássico dos clássicos da literatura de viagens, "Na Patagónia", escrito por Bruce Chatwin, tem sido lido por milhões de interessados. E, mais de 30 anos depois da morte do autor, quer o livro, quer aquele que o escreveu continuam a ser alvos de admiração.
"Fui para a Patagónia." A frase é pelo menos tão lendária como a forma que Bruce Chatwin escolheu para se demitir do cargo de crítico de arte na "Sunday Times Magazine", depois de ter feito todo o percurso entre porteiro e diretor da Sotheby's, enviando um telegrama com apenas aquele conteúdo ao seu editor e quando já se encontrava na Argentina. Estava-se em meados dos anos 70, Chatwin foi mesmo para um lugar que o fascinava, viajando por aquelas remotas paragens e descrevendo com mestria os ambientes, a solidão, a paisagem monumental, os lugares, as pessoas, todo um universo majestoso e esmagador do Rio Negro a Ushuaia. Também não faltou quem o acusasse de fantasiar e inventar, sobretudo em relação aos habitantes da Patagónia, mas isso só contribuiu para que aumentasse o universo dos seus leitores. Mas a história contou com um forte incentivo dois anos antes de se concretizar: em 1972, quando foi ao atelier da designer e arquiteta Eileen Gray, já nonagenária, Bruce Chatwin viu um mapa da América do Sul pintado pela entrevistada, no qual se evidenciava a Patagónia. Durante a conversa, descobriu que Gray sentia como ele um enorme fascínio pela região. "Vá lá por mim", disse-lhe Eileen Gray. Em novembro de 1974, Chatwin estava a bordo de um avião para o Peru e, logo depois, rumou à Patagónia, ali permanecendo durante seis meses. O resto é história. Ou melhor, são as histórias e as descrições bem conhecidas de "Na Patagónia".
Charles Bruce Chatwin nascera em Sheffield, a 13 de maio de 1940, vivera em Birmingham, estudara no Marlborough College e só rumara a Londres em 1958 para ser porteiro da Sotheby's, ali fazendo a evolução mencionada acima até diretor graças à precisão revelada pelo seu olhar. Porém, o estrabismo que lhe foi diagnosticado em 1964, obrigou-o a uma pausa de seis meses, intervalo que aproveitou para visitar o Sudão. Quando voltou, já não era a arte que lhe suscitava um interesse mais profundo, mas sim a arqueologia, algo que o levou a entrar na Universidade de Edimburgo em 1966. Mas demorou pouco esse entusiasmo e, dois anos mais tarde, Chatwin já abandonava os estudos universitários. Teria, então, oportunidade de regressar ao mundo da arte como crítico no mundo jornalístico até que o fascínio pela Patagónia foi mais forte e, a partir de então, transformou-se num viajante infatigável. Mas, logo em 1980, ano em que publicou "O Vice-Rei de Ajudá" - seria adaptado ao cinema pelo realizador Werner Herzog -, contraiu o vírus HIV, situação que, aos poucos, o foi debilitando.
Ainda assim, procurou esconder a SIDA, numa fase em que a doença era ainda pouco conhecida e os pacientes acabavam por ser confrontados com a discriminação e a marginalização. Enquanto lhe foi possível, continuou a viajar e a escrever, publicando "Os Gémeos de Black Hill" em 1982 (a obra seria mais tarde adaptada ao cinema).
Algum tempo depois, Chatwin estava a caminho da Austrália para pesquisar sobre o livro seguinte que foi publicado em 1987 com o título "O Canto Nómada".
Entretanto, a doença progredia e Chatwin passou por extremas dificuldades, instalando-se na cidade francesa de Nice com Elizabeth, a mulher, a quem conhecera nos anos 60 na Sotheby's e com quem casara em 1965. "Utz", de 1988, foi o último livro que publicou em vida.
Apesar dos cuidados da mulher e de uma enfermeira, o avanço da doença era irreversível. A 18 de janeiro de 1989, com apenas 48 anos, Bruce Chatwin morreu.
A título póstumo iriam surgir vários livros, o primeiro logo nesse ano, intitulado "O que Faço Eu Aqui?", uma reunião de ensaios, reflexões, relatos de viagens e outros textos, cuja seleção foi ainda feita pelo próprio autor.
Quetzal Editores/Tradução de José Luis Luna
O romancista Nicholas Shakespeare, autor do livro "O Mestre da Dança", publicou em 2001 a mais admirável biografia de Bruce Chatwin.
"Debaixo do Sol" (1993) é já organizado pela viúva e por Nicholas Shakespeare, apresentando cartas e postais nas quais se revela muito mais do que nos livros de viagens antes publicados, nomeadamente as angústias quanto à sua condição de bissexual.
O ano de 1997 voltou a ter um livro com textos dispersos de Chatwin sobre os mais variados temas: "Anatomia da Errância".
Em 1999, um livro com fotografias tiradas por Bruce Chatwin durante as suas andanças pelo Mundo foi publicado com o título "Winding Paths".
E de 2009 é o título que reuniu textos de dois dos grandes autores de livros de viagens (Chatwin e Paul Theroux): "Regresso à Patagónia".
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