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Paulo Jorge Pereira

"Um Homem e Duas Mulheres", de Doris Lessing

Prémio Nobel da Literatura em 2007, Doris Lessing foi, nessa altura, apenas a 11ª mulher a receber a distinção. Nascida no Irão (então ainda conhecido como Pérsia pelos europeus), Lessing publicou a coletânea "Um Homem e Duas Mulheres" em 1963.



Apesar dos inúmeros elogios recebidos aquando da distinção com o Prémio Nobel - Mario Vargas Llosa, Rosa Montero, Ana María Moinx ou José María Guelbenzu foram apenas alguns dos exemplos -, também houve vozes discordantes. Umberto Eco até considerou ser justo, mas referiu a sua estranheza por "um autor de língua inglesa vir a ganhar o prémio tão pouco tempo depois de Harold Pinter"; "dececionante" foi a palavra usada pelo crítico literário germânico, Marcel Reich-Rannicki, para classificar a decisão da Academia, apontando John Updike e Philip Roth como "escritores de língua inglesa mais importantes e mais significativos". Mas a rejeição mais contundente veio do crítico literário norte-americano, Harold Bloom, que viu sinais de "politicamente correto" na atribuição e acrescentou: "Ainda que a senhora Lessing, no começo de sua carreira, tenha mostrado algumas qualidades admiráveis, penso que o seu trabalho nos últimos 15 anos é um tijolo, isto é, ficção científica de quarta categoria", defendeu. Certo é que para a autora o galardão transformou-se naquilo que a própria definiu como "um maldito desastre". Porquê? Porque passou a receber múltiplas solicitações para entrevistas e fotos, algo que a deixou desprovida de energia para escrever mais como era seu desejo.

Filha do capitão Alfred Tayler e de Emilie Maude McVeagh - com quem se casou depois de esta ter sido sua enfermeira quando ele recuperava da amputação de uma perna, consequência de combates na I Guerra Mundial -, Doris acabaria por nascer no Irão (então ainda Pérsia), a 22 de outubro de 1919. Os pais trocaram Londres por Kermanshah porque ele fora contratado para trabalhar como funcionário do Imperial Bank of Persia. Seis anos mais tarde, os Tayler mudaram-se para a então Rodésia do Sul (atual Zimbabué), colónia britânica onde o ex-capitão comprara uma propriedade e onde pretendia dedicar-se à agricultura. Doris iria estudar numa escola só para raparigas (Secundária do Convento Dominicano), mas, detestando a forma como as freiras dominicanas conduziam a educação, deixou aquele espaço com apenas 13 anos e, aos 15, face ao confronto com a mãe, saiu de casa para se tornar aprendiz de ama. Foi aproveitando livros dos patrões para continuar a formação, nomeadamente em áreas como sociologia e política, datando desta fase os seus primeiros escritos. De 1937 é a sua passagem para o papel de telefonista e o casamento com Frank Charles Wisdom, de quem teria uma filha e um filho, realizou-se em 1939. Contudo, em 1943 já estavam separados e a guarda dos filhos foi atribuída a Frank. Passa a frequentar o Left Book Club, espaço de leituras que congregava seguidores do comunismo, aqui conhecendo o germânico Gottfried Lessing, seu segundo marido e de quem teve um filho. O casamento realizou-se em 1945, mas desfez-se quatro anos depois (em 1979, Gottfried seria assassinado quando era embaixador da República Democrática Alemã no Uganda, em plena revolta contra o ditador Idi Amin Dada). Desta vez, Doris Lessing pôde manter o filho perto de si e viajaram rumo a Londres.

Pelo meio da instabilidade na sua vida pessoal, continuara a escrever e pôde publicar quase de imediato o romance "The Grass is Singing". Iria publicar dezenas de obras (romances, livros de contos, memórias, coletâneas, ensaios, peças de teatro, poemas), algumas delas sob o pseudónimo de Jane Somers, destacando-se "The Golden Notebook", de 1962. Com o decorrer do tempo, não deixou de assumir posicionamentos políticos (chegou a ser impedida de entrar na África do Sul por criticar com dureza o regime do apartheid, o recurso a armas nucleares e condenou os princípios e o rumo seguido pelos governos de Margaret Thatcher) e de erguer a voz em nome do feminismo, dos mais pobres, de países do Terceiro Mundo.


Editora Ulisseia

Ao atribuir-lhe o Prémio Nobel da Literatura, a Academia Sueca justificou-se com a sua "capacidade de transmitir o sentido épico da experiência feminina e narrar a divisão da civilização com ceticismo, paixão e força visionária".

Lessing ganhou inúmeros prémios ao longo do percurso literário, foi várias vezes finalista no Man Booker Prize e foi escrevendo até publicar "A Fenda" em 2007. Morreria com 94 anos, a 17 de novembro de 2013.


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